Medo do coronavírus pode agravar estado de saúde de pacientes crônicos

Os hospitais estão tendo uma “fuga”de pacientes por medo de contaminação com o novo coronavírus; as instituições estão preparadas para receber tanto os pacientes com Covid-19, como pacientes com outras doenças e incidentes de saúde

A demora em procurar ajuda em um hospital por medo de contágio do Coronavírus levou uma mulher, na faixa dos 70 anos, a agravar seus problemas de saúde. Ela sofreu uma queda em casa, fraturou a coluna e, esperou cinco dias para ir ao hospital, ficou em casa sem movimentos, o que gerou uma tromboembolia pulmonar. O relato é do médico e diretor técnico do Hospital Marcelino Champagnat, Rogério de Fraga.

O caso, ocorrido no fim de março, e outras histórias de complicações por não procurar ajuda médica a tempo são relatados pelo médico, como a dificuldade que a equipe do hospital teve para convencer um paciente com sintomas de AVC para ficar no estabelecimento de saúde. “Temos um nível de cuidado máximo, bem como protocolos e utilização de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), a divisão de fluxos de paciente com Covid-19 e seus sintomas, separado de pacientes com outras doenças, além de uma ala preparada para o isolamento”, diz o médico.

Segundo o presidente do Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Paraná (Sindipar), Flaviano Feu Ventorim, a maior parte dos doentes que estão nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) dos hospitais privados do Paraná, atualmente, é de pessoas com doenças crônicas e/ou graves e não com a Covid-19. São pessoas que tiveram descompensação de seus quadros por não terem se tratado, principalmente com doenças cardiovasculares e pulmonares, câncer, diabetes, e doenças psiquiátricas. A média de ocupação desses hospitais caiu 40% durante a pandemia em comparação com uma média de 75% registrada normalmente. O Paraná tem atualmente 4.200 leitos de UTI’s públicos e privados. E 1.900 são somente leitos privados e que não atendem o SUS, segundo o Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (Cnes).

De acordo com Ventorim, a maioria dos hospitais privados do Paraná está preparada para atender os pacientes durante a pandemia. Vários têm a certificação de qualidade ONA, canadense e americana, que prevê a estruturação e execução de planos de contingência para situações como a pandemia. O presidente do Sindipar conta que desde que começaram os primeiros casos no País, os hospitais investiram em infraestrutura, equipes e fluxos para atender a população. Enquanto alguns construíram novas UTIs e áreas de emergência específicas para receber os pacientes com sintomas de doenças respiratórias ou com a Covid-19, outros investiram na alteração de fluxo, separando áreas distintas para receber pacientes com a doença e outras não relacionadas à Covid-19.

Pânico

O medo de se contaminar com o novo coronavírus, que afugentou as pessoas com doenças crônicas e graves dos hospitais, aconteceu também em países como a Espanha, Itália e EUA, que tiveram aumento de mortalidade por doenças não relacionadas à Covid-19. Na região Norte da Itália, por exemplo, houve um incremento de morte por doenças cardíacas fora dos hospitais em 58% durante a pandemia. A incidência de mortes em casa em Nova York aumentou 800% em abril deste ano. Em São Paulo, a mortalidade domiciliar por causa de infarto agudo do miocárdio subiu 80%, segundo a Vigilância Epidemiológica daquele Estado.

A cardiologista intervencionista Viviana Guzzo Lemke alerta que os pacientes com doenças cardiovasculares, mesmo durante a pandemia, precisam procurar os hospitais ou seu médico quando tiverem qualquer sinal de descompensação da sua doença ou ao ter sintomas compatíveis com infarto, como dor no peito, falta de ar e sudorese. Viviana conta que não está sendo incomum os pacientes chegarem no hospital já com complicações do infarto, por terem demorado a procurar o atendimento médico. Foi o caso de um paciente que procurou o hospital dois dias depois de sentir dores no peito. Ele já estava infartado e com insuficiência cardíaca. “É importante que o paciente saiba que o infarto não respeita quarentena”, diz a médica. Os hospitais que atendem pacientes com problemas cardiológicos chegaram a atender apenas 30% dos pacientes em comparação a igual período no ano passado, por causa do medo das pessoas contraírem o novo coronavírus.

O oncologista Evanius Garcia Wiermann alerta também que o paciente não pode negligenciar o câncer por causa do medo do novo coronavírus. “O câncer não é menos importante que a Covid-19. Provavelmente teremos um surto, no próximo ano, de pessoas com câncer. As pessoas diagnosticadas com a doença não podem abandonar o tratamento. E quem tem histórico na família ou sintomas precisa fazer exames, procurar o hospital ou o seu médico”, avisa. Ele cita uma estatística do Instituto Nacional de Câncer (Inca) de que o Brasil vai ter 50 mil menos casos de câncer diagnosticado este ano por causa da pandemia e do medo que ela dissemina entre as pessoas. Wiermann relata que há até casos de pessoas que abandonaram o tratamento quimioterápico por medo de contrair a Covid-19 em hospitais.

“A população não pode entrar em contato com o outro “p” de pandemia que é o pânico. As pessoas precisam conversar com seus médicos e ter um hospital de confiança com ambiente seguro. Os bons hospitais estão preparados para dar atendimento com segurança, tanto de pacientes com a Covid-19 quanto de pacientes com outras doenças não relacionadas à essa doença”, afirma o superintendente médico do Vita Batel, Gustavo Justo Schulz.

Os hospitais especializados registraram uma queda de 50% no atendimento por causa da pandemia. Segundo a neurologista Vanessa Rizelio não há coincidência alguma: mortes por infartos e acidente vascular cerebral (AVC) podem aumentar durante o período de isolamento social. Como estas doenças se manifestam de forma súbita, é bom estar atento aos sinais. “Temos observado não só aqui no Brasil, mas no mundo, a diminuição de chegada de pacientes com suspeita de AVC aos hospitais”, avalia. “E quando vão, chegam além do tempo para estabelecer um tratamento que melhora o quadro e evitar sequelas (até quatro horas do início dos sintomas)". Entre os sintomas do AVC estão a dificuldade para falar, pronúncia de palavras ou de a pessoa enrolar a língua; e falta de coordenação motora com desequilíbrio na hora de tentar caminhar, entre outros.

Vacinas

No início do isolamento social houve uma retração na procura por vacinas, de modo geral, até por quê algumas recomendações estavam divergentes se era recomentado fazer ou não a vacinação em função do novo coronavírus. Mas desde que a Sociedade Brasileira de Imunizações se posicionou deixando claro que as vacinas não deveriam ser adiadas houve um retorno de forma progressiva na procura e o volume de atendimentos está normalizando. “Não estar com a vacinação em dia pode levar a uma debilidade imunológica, que pode tornar a pessoa mais suscetível ao coronavírus e outras infecções”, avisa a coordenadora do Centro de Vacinas do Hospital Pequeno Príncipe, Heloisa Ihle Giamberardino.

Suicídios

A psiquiatria é uma das áreas mais impactadas pela pandemia porque os transtornos mentais como a ansiedade, depressão e Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), por exemplo, aumentam nesse período, segundo o psiquiatra Roberto Ratzke. O afastamento das pessoas dos hospitais e clínicas acaba piorando a saúde mental dos pacientes, que podem enfrentar outro tipo de problema também com uma medida recente da Anvisa no período da pandemia, de acordo com o psiquiatra. Em sua opinião, a permissão para os médicos darem receita para três meses é perigosa porque o acúmulo de remédios pode levar a pessoa com transtorno mental a cometer suicídio, tomando todos os comprimidos. “Nosso receio é que muita gente vá morrer por suicídio por ter acesso a mais remédios de receita por um período mais longo”, avisa. Outro aspecto que pode se agravar com o afastamento de pacientes do tratamento psiquiátrico provocado pelo medo do novo coronavírus são as psicoses, como a esquizofrenia, por exemplo. Segundo Ratzke, em geral o paciente com psicose não tem noção que está doente e tem dificuldade em ir ao médico. Com a pandemia, o psiquiatra prevê o aumento de crises psicóticas ocorrendo em casas e famílias sofrendo em lidar com o problema.

Sindipar, Ahopar, Fehospar

Queda de 50% na ocupação dos hospitais privados e aumento de custos com Covid-19 devem reduzir funcionários e leitos disponíveis

Hospitais do Paraná podem não sobreviver à pandemia do
coronavírus se medidas urgentes não forem tomadas

O Sindipar - Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná – estima uma queda de 50% na ocupação dos hospitais do Estado e prevê uma consequente redução no quadro de funcionários e leitos das instituições privadas nos próximos dias. Os representantes do setor esperam que soluções propostas pela entidade – como isenção de taxas de luz e água e isenção de ISS (Impostos sobre Serviços) – sejam aceitas pelo Governo para diminuir O prejuízo na casa de milhões para as instituições e cortes em todos os setores.

A queda na ocupação de leitos foi impulsionada pelas medidas de contenção à Covid 19, situação que fez com que a maioria das cirurgias e consultas eletivas fossem canceladas, causando um esvaziamento dos hospitais. O Paraná tem 484 hospitais privados (filantrópicos e não filantrópicos) e públicos. São aproximadamente 28 mil leitos no Estado, sendo 4,3 mil leitos de UTI.

“Apenas metade desses leitos estão ocupados hoje causando prejuízo e dívidas para as instituições”, aponta o presidente do Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Paraná (Sindipar) e da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná (Femipa) Flaviano Feu Ventorim. Ele explica que as associações que representam os hospitais se uniram para propor medidas que evitem o endividamento das instituições e garantir que os hospitais não fechem as portas como consequência da situação.

Além da queda de 50% dos leitos nos hospitais particulares e filantrópicos, o atendimento clínico também sofreu alteração. A estimativa do Sindipar é que 60% dos atendimentos foram cancelados desde abril. “Essa realidade já causou uma redução de 30% no quadro de funcionários”, revela Ventorim, sem descartar a possibilidade de novas demissões acontecerem nos próximos dias.

O Sindipar está propondo planos de incentivo ao setor para evitar o colapso financeiro, mas ainda não obteve retorno do governo. “A resposta precisa ser urgente para que as portas dos hospitais não fechem com a pandemia”, diz o presidente do sindicato. Ele explica que todos os hospitais representados pelo Sindipar operam com taxa de ocupação reduzida, mas que os custos fixos de cada instituição não diminuíram, o que causa prejuízos ao fluxo de caixa. A estimativa é que o faturamento dos hospitais tenha caído cerca de 60%.

Sindipar, Fehospar, Ahopar

Hospitais do Paraná destacam ações das instituições para enfrentar o novo coronavírus

O presidente da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná (Femipa) e do Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná (Sindipar), Flaviano Feu Ventorim, e os presidentes da Associação dos Hospitais do Paraná (Ahopar), José Octávio da Silva Leme Neto, e da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde no Estado do Paraná (Fehospar), Rangel da Silva, realizaram, nessa segunda-feira, 23 de março, uma coletiva de imprensa para falar sobre as medidas adotadas pelos hospitais no combate à pandemia de Covid-19.

De acordo com Ventorim, os hospitais têm, hoje, uma estrutura organizada de atendimento e estão mantendo uma boa rotina de trabalho. Porém, apesar disso, a preocupação agora é com os itens básicos de proteção individual, como máscaras e luvas, por exemplo. “Houve um consumo intenso, inclusive da população, e o estoque que tínhamos para alguns meses foi consumido em duas semanas. Por isso, estamos adotando medidas para controle, para sanear essas situações, colocando algumas travas importantes na hora de distribuição, para não faltar nenhum equipamento de proteção para aqueles que estão na linha de frente, que são os profissionais de saúde”, destacou. Ele lembrou, ainda, que é importante a população se conscientizar de que não deve comprar esses insumos sem necessidade, gerando um desabastecimento no mercado.

Para garantir o atendimento à população, as instituições têm adotado algumas orientações do Ministério da Saúde, como o cancelamento de cirurgias eletivas e atendimento ambulatorial eletivo. No momento, a indicação é atender somente urgência e emergência, e a exceção são os pacientes crônicos, que precisam de continuidade no tratamento.

Outra medida apontada por Ventorim foi com relação à proibição de visitas nos hospitais, pois há uma grande preocupação com os colaboradores envolvidos no dia a dia das instituições de Saúde. “Por orientação do Ministério da Saúde, cancelamos visitas para justamente limitar o número de pessoas dentro de um hospital. Precisamos evitar que pessoas que estejam com COVID-19 e não tenham sintoma entrem no hospital e contaminem os demais. Isso protege os colaboradores e também a população de modo geral. Ainda não estamos em um momento crítico e, por isso, queremos tomar medidas extremas agora para que possamos estar preparados em uma eventual necessidade, se a situação se agravar”, garantiu.

Leitos
Ventorim destacou que o Paraná tem, hoje, 15.191 leitos, sendo 10.805 do Sistema Único de Saúde (SUS). Desse total, são 2.022 leitos de UTIs adulto – 1.218 do SUS. Na avaliação dele, o Paraná tem uma boa relação de leito-paciente quando comparado aos números do Brasil. Também é importante reforçar que há a possibilidade de se transformar enfermarias em leitos de cuidado intensivo, mas isso vai depender da demanda e da logística de equipamentos e insumos.

Preocupações
De acordo com o presidente da Femipa e do Sindipar, Flaviano Feu Ventorim, a preocupação no momento é com relação a medidas duras que estão sendo tomadas por alguns municípios, como fechar limites da cidade ou paralisar o transporte coletivo. “Fechar os limites dificulta a entrega de materiais e insumos e também a logística dos colaboradores, pois sabemos que, no interior, é muito comum que os profissionais de Saúde trabalhem em diferentes cidades. Além disso, eles precisam de transporte para chegar até o trabalho. Nesse sentido, nossa sugestão é que os prefeitos tenham esse cuidado na hora de adotar medidas. Em Curitiba, por exemplo, houve redução de horários de transporte, mas não paralisação. Assim, conseguimos organizar a sistemática de chegada nos hospitais”, ressaltou.

Para melhorar esse cenário, a primeira indicação dos hospitais do Paraná é para que as pessoas fiquem realmente em casa. Segundo ele, essa medida ajuda a diminuir o contágio de COVID-19; protege dos males da sociedade contemporânea que exigem ida aos hospitais, como acidentes; e reduz a exposição das pessoas ao sarampo e à dengue, doenças que ainda estão circulando pelo Paraná. “São ações que ajudam a reduzir o volume de pessoas dentro dos hospitais, garantindo que sobre espaço para aqueles que realmente precisam. O grande risco que corremos no sistema de saúde é justamente a doença chegar de forma abrupta e atingir muitas pessoas de uma vez. Por isso as medidas de contenção são tão importantes. Também indicamos que haja uma forte campanha de vacinação contra a gripe. Assim, conseguimos tomar medidas mais rápidas de atendimento em pessoas vacinadas que apresentem sintomas, pois a H1N1 já pode ser descartada”, afirmou.

Novas demandas
Para se antecipar às demandas, Ventorim comentou que cada hospital está criando a sua forma de se estruturar e de planejar seus fluxos internos, organizando o fluxo de pessoas e separando pacientes com problemas respiratórios dos demais, por exemplo. Nesse cenário, ele reforçou que as instituições de Saúde têm contado com o apoio da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) e do governo do Estado. Uma das ações, por exemplo, foi buscar indústrias paranaenses que possam mudar sua linha de produção para atender às necessidades urgentes da saúde.

“Estamos tomando todas as medidas possíveis para proteger as pessoas. Talvez tenhamos que solicitar à população que fez estoques de materiais que traga esses produtos aos hospitais para que possamos proteger aqueles que estão na linha de frente, que estão envolvidos no atendimento ao doente. Há um esforço muito grande dos governantes para ajudar nesse momento difícil, e precisamos nos unir e olhar pelo outro”, reforçou.

Ainda sobre isso, José Octávio da Silva Leme Neto, presidente da Ahopar, salientou que os hospitais estão criando comitês de gestão de crise para discutir, diariamente, as ações e próximos passos. Ele reforçou que as entidades que representam o setor estão dando total apoio às instituições, inclusive na articulação com o governo e na troca de experiências.

Rangel da Silva, presidente da Fehospar, finalizou a coletiva, lembrando à imprensa que é preciso reforçar à população os protocolos de atendimento, pois esse é um momento de “combate à guerra e é preciso ter doentes nos lugares corretos”. “De acordo com o plano de contingência do Estado, cada macrorregional terá um hospital de referência e os demais serão de retaguarda”, completou.

Fehospar, Ahopar, Sindipar e Femipa